quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Concerto cotidiano: rock das ruas curitibanas

Algumas pessoas dizem que certas músicas lembram certos momentos da vida. Talvez o fato da música ter sido ouvida repetidamente em algum momento específico faça com que a pessoa retome aquele momento maravilhoso com suas sensações, como o êxtase do primeiro beijo para os românticos que ouvem a música do casal, a fossa do fim de namoro para os deprimidos e bipolares que ouvem música de corno ou a emoção do começo de um "novo" episódio do Dragon Ball para os piás de prédio que ouvem aquela porcaria de música de entrada. Os artistas vão além e sugerem que momentos sugerem músicas e trazem a inspiração necessária à composição.

Não sou um artista. Talvez dos três grupos citados há pouco, posso me considerar como membro de todos. Apesar disso, há momentos que me sugerem músicas. Não as músicas inteiras, mas pelo menos os títulos.

E foi esse sábado um daqueles dias de inspiração. Vários momentos renderiam músicas incríveis baseadas no teatro cotidiano, e vários estilos diferentes podem ser destacados ali no meio. Nomes em inglês, apenas porque em português eles perdem a cara de nome de música (afinal, estamos habituados a ver nomes horríveis de música em inglês apenas).

O concerto poderia começar com o estilo punk. A música "Keep your flags up" traria o tempero patriota para falar sobre as pessoas balançando bandeiras com dizeres "Vote XX, Fulano de Tal" pelas ruas, num som que dá vontade de dar pulinhos e que, curiosamente, não te dá vontade de votar em ninguém. Músicas mais pesadas poderiam seguir, como a "I don't like you", uma música mais pesada e de ritmo mais rápido, com ênfase na bateria (Que curiosamente lembra um concerto de latas de lixo viradas de ponta cabeça sendo tocadas por trolls equipados com troncos de árvores) e falaria sobre uma temática mais curitibana, como o agradável hábito das pessoas não te responderem quando você dá bom dia.

Com o estilo aos poucos abandona o punk e parte para um instrumental gradativamente mais pesado, aos poucos nos aventuramos no ambiente do thrash metal e passamos a sacudir nossas cabeças enquanto uma pessoa nos insulta no palco. "Bruised" daria início a uma reflexão sobre a inabilidade de certos motoristas a estacionar nas vagas a eles disponíveis. "Stay away from me" retrata os desejos desesperados daqueles que são abordados por religiosos na rua e não estão interessados no algodão sagrado benzido no óleo de jerusalém (que por algum motivo não explicado te trará dinheiro e é de graça - afinal eles não estão interessados no seu dinheiro).

O concerto quebra o clima para partir ao power metal melódico. É necessário quebrar o clima ao invés de partir aos poucos na direção do estilo, uma vez que power metal melódico não combina com porra nenhuma. Mas as temáticas medievais comuns a esse estilo muito lembram o convívio das grandes cidades. "Living by the blade" falaria sobre a luta cotidiana do trombadinha que, cansado do discurso de que "poderia tá robanu, poderia tá matanu, mas tá pedinu", decidiu por assumir uma atitude decidida e honrosamente batalhar por seu sustento. Batalhar no sentido literal, afirmando que está "robanu e é melhor cê dá a grana ou ele vai tá te matanu", então ele corre em perseguições em meio à cidade fugindo da próxima música: "Knights of Justice" que fala da polícia muito interessada em resolver os problemas da população humilde.

E o concerto, para voltar a ter alguma música, quebra novamente o clima abandonando o power metal. Por conveniência, termina com músicas de prog metal. "Curitiban Skies" iniciaria falando sobre o belo céu que banha os curitibanos com seu nobre tom cinzento, alimentando os desejos europeus desses cidadãos de bem de permanecerem em suas casas sem falar com ninguém. "Dilma in the rain" falaria sobre o cartaz político abandonado à chuva. Para finalizar o concerto, "No Yellows on Horizon", uma música de 25 minutos que trata em tempo real dos pensamentos turbulentos da pobre mente abandonada ao relento da espera do ônibus Vila Rex, com solos de guitarra escritos em partitura e viradas de bateria que estarão ali pra encher linguiça e manter o tempo longo e te lembrar o quanto esses músicos são foda e o quanto você não se parece com eles.

Após o concerto, o curitibano continua olhando para um ponto fixo para não precisar encara ninguém à sua volta.