quinta-feira, 17 de julho de 2008

Rua Bôrtolo Gusso

Dizem alguns teólogos que há um período de 400 anos que precedem o novo testamento da Bíblia durante os quais houve pouca ou nenhuma manifestação divina entre o povo de Deus. 400 anos de silêncio. Ou talvez 400 anos não registrados. De qualquer forma, 400 anos não anotados para o cristianismo, são 400 anos e, mesmo assim, as religiões derivadas do judaísmo não perderam seus adeptos. Infelizmente, em um blog as coisas não funcionam assim... um mês sem postagens culmina em uma redução significativa no número de espectadores e no interesse dos remanescentes. Enfim, contrariando as expectativas de muitos, aqui estou eu novamente, de férias e com outro conto de veracidade duvidosa para contar.

Como de costume, o fato aqui narrado demonstra a riqueza cultural de nossa modesta sociedade e, acima de tudo, o tino e a boa educação constantes das nossas efetivas políticas de boa vizinhança. E, como de mais costume ainda, o fato aqui narrado foi flagrado indecorosamente por meus inocentes sentidos.

A Rua Bôrtolo Gusso é, sem sombra de dúvida, uma excelente referência: É atravessada por mais de cinco linhas de ônibus, liga a Avenida Brasília ao Fim do Mundo, uma nobre região, habitada por diversos sobrados, condomínios, favelas e pelo Flubber, sendo que todos os moradores dessa região dependem dessa rua. Certamente uma rua de vital importância e relevante significância para alguns; pena que o resto da cidade sequer sabe que ela existe.

Em uma rua de tamanha movimentação e importância, levando em conta toda a sensatez de nosso povo curitibano e o fato de o Interbairros II passar por ali, podemos também andar preocupados com situações embaraçosas e inusitadas, como manifestações da boa educação regional, motoristas de final de semana aventureiros em uma segunda feira, vendas de DVDs piratas em saída de mercado, viaturas policiais preocupadas com o bom cumprimento da lei e abordagens políticas de filho de candidato político (afinal, ele vai pintar o muro da sua casa com uma propaganda e depois passa uma demão de tinta, vai ficar como novo). Apesar de tão vasta gama de eventos e figuras presentes em tão respeitosa rua, certamente os mais impressionantes são os nobres e cultos "playboys", o patriciado do Capão Raso, os filhos da nobre burguesia e os proprietários dos carros legais e dos cérebros mais avantajados, e algumas moças que transitam periodicamente pela região.

Esse, como muitos outros, era o carro de um playboy. Uma característica playboy bastante ostensiva é, sem sombra de dúvidas, a ansiedade e o esforço em manifestar suas opiniões a respeito de problemas a eles alheios, críticas construtivas de caráter geral com o simples intuito de ajudar e enriquecer, compartilhando de forma autruísta o conteúdo guardado com tanto esmero em suas mentes divagadoras, caçadoras da nobre cultura e da produção intelectual. O fato que narro aqui é proveniente de um momento desse porte.

E desço eu do ônibus e ando a caminho de minha casa. Uma noite tranqüila na rua Bôrtolo Gusso, como muitas outras. Um grupo de moças caminhava e conversava descontraidamente e um carro vinha da mesma direção. Ao passar pelas moças, o rapaz, motorista do carro, tal como o passageiro a seu lado, exibiam sua bela e sonora buzina, acompanhando o harmonioso som com seus comentários portados da sabedoria secular da grande cidade. Diziam eles "Vem me fazer um , suas vadias!", ao que as moças, prontamente, contagiadas pela originalidade do comentário, diziam "Não sou sua mãe, seu idiota!". O carro se afasta com mais buzinas e mais comentários dotados da sutileza típica da pessoa de cultura. Não posso negar que a comunicação verbal é uma das maiores dádivas que o intelecto humano já fora capaz de desenvolver, possibilitando a troca de experiências e de conhecimentos de uma forma abstrata e eficaz. Não tenho dúvidas de que moro em uma cidade de elevada cultura, uma verdadeira Europa brasileira.

Um comentário:

Cinthia disse...

Essa foi uma das maiores concentrações d sarcasmo q eu já vi num texto seu... Tava inspirado, hein